O ambiente de trabalho e o dano moral

Publicado em: 27/08/2013

Verônica Castro Uemura

A indenização por dano moral prevista no art. 5º, inciso V, da Constituição Federal, não está restrita apenas ao direito individual, mas abrange também o direito de determinada coletividade. Recentes julgados e doutrina dominante entendem que quando valores e interesses fundamentais de determinado grupo são lesados, necessário se torna a defesa ao patrimônio imaterial desse grupo.  E ainda, a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) prevê expressamente a possibilidade do reconhecimento do dano moral coletivo em seu art. 1º, inciso IV.1

Dito isso, abordaremos especificamente o dano moral coletivo trabalhista que poderá ser verificado nos casos em que o empregador, descumprindo obrigações legais, prejudica uma coletividade de trabalhadores de tal modo que acabe por desencadear a repulsa social desse grupo. Podemos tomar como exemplo casos em que superiores hierárquicos agridem seus subordinados verbalmente, com insultos, comportamento agressivo de forma continuada ou os constrange perante os colegas de trabalho, com apelidos, ameaças para tentar elevar o índice e alcançar metas de vendas, ou seja, métodos fora do razoável, que desrespeitam os valores morais e extrapolam determinadas normas de conduta no trabalho.

Alexandre Agra Belmonte, bem traz algumas hipóteses em que o empregador pode causar dano moral a grupos de trabalhadores: 

... quando promove trabalho escravo, forçado ou ainda de menores de 16 anos; quando deixa de satisfazer o pagamento dos salários, não obstante aplique os recursos empresariais em outros investimentos; quando, deliberadamente, não cumpre as normas de segurança e medicina do trabalho, colocando em risco a saúde, a vida do trabalhador; quando promove atos discriminatórios às mulheres, por exemplo, revistas íntimas ou imposição de intervenções para esterilizações como condição de continuidade do vínculo; quando promove causas simuladas para acordos de rescisão; quando obtém, por ocasião e como condição da contratação, assinatura em pedidos de demissão ou em termos de quitação assinados em branco; quando discrimina por sexo, raça e religião nas admissões; quando atinge grupo de trabalhadores por racismo ou preconceitos; quando o empregador pratica atos atentatórios da liberdade sindical ou do direito de greve.2

Percebe-se, pois, a realidade de tal conduta pelo número crescente de ações judiciais propostas por sindicatos e pelo Ministério Público do Trabalho demandando indenizações por dano moral coletivo na esfera trabalhista. Recentemente foi amplamente noticiado o caso da condenação de uma empresa multinacional do ramo de bebidas ao pagamento de R$ 700 mil por assédio moral coletivo sofrido por seus funcionários no ambiente de trabalho em uma ação proposta pelo Ministério Público do Trabalho. Esse valor deverá ser revertido ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) caso a empresa cumpra a decisão de primeira instância, no entanto, a mesma poderá ainda recorrer aos tribunais superiores.

No entanto, esse é um tema que ainda carece bastante de legislação que o regulamente ou crie parâmetros para fixação do valor das indenizações. Atualmente, a jurisprudência vem se formando baseada apenas na legislação civil e nos direitos e obrigações de cunho trabalhista, o que pode levar a indenizações desmedidas e desproporcionais a cada caso.

Vale destacar que os tribunais do país, para uma real apuração do dano moral coletivo, vêm pautando suas decisões na análise do prejuízo da conduta do empregador e a repulsa social decorrente dela, ou seja, o ilícito e seus efeitos deverão atingir os valores fundamentais compartilhados por essa coletividade injustamente lesada. A lesão deverá importar na imediata reação social, não se pautando apenas no descumprimento pelo empregador das normas de conduta laboral. Nesse sentido o seguinte julgado do Tribunal Superior do Trabalho:

(...) Ementa: DANOS MORAIS COLETIVOS. HIPÓTESE QUE NÃO SE CONFIGURA. O dano moral coletivo pressupõe um ilícito que enseje imediata repulsa social, para o que não se pode dispensar, in casu, a demonstração do nexo causal entre a conduta empresarial no cumprimento da norma e a lesão à coletividade. Na apreciação dos fatos, o tribunal regional afirmou que a inobservância reiterada da reclamada quanto ao cumprimento da legislação trabalhista no tocante à jornada de trabalho não submete a coletividade a uma situação indigna apta a autorizar a reparação por danos morais. Recurso de revista de que não se conhece.(...)3

Além disso, é necessário que a empresa tenha pelo menos agido com culpa para ser responsabilizada pelo dano causado a essa coletividade de trabalhadores. Nesse sentido, a melhor forma de uma empresa minimizar o risco de uma condenação em ações de dano moral coletivo ainda é agir de forma preventiva, evitando esse tipo de conduta ilícita e cumprindo as normas legais.

Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: [...]IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo [...]

BELMONTE, Alexandre Agra. Danos morais no Direito do Trabalho, 3. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 167-168

TST; RR 1102-73.2010.5.03.0139; Quinta Turma; Rel. Min. João Batista Brito Pereira; DEJT 31/08/2012; Pág. 2184     

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