DRAWBACK: A Modalidade Suspensão e a Inaplicabilidade do Princípio da Vinculação Física

Michel Alkimin
Publicado em: 14/12/2020

O Drawback é o regime aduaneiro especial que consiste em incentivo à exportação, pois promove a suspensão dos tributos incidentes na importação (II, IPI, PIS/CONFINS-Importação) sob o compromisso assumido pelo importador de empregar os insumos importados na industrialização de mercadorias que posteriormente serão exportadas (artigo 383 do Decreto 6.759/2009 - Regulamento Aduaneiro[1]). O benefício é concedido pela Secretaria de Comércio Exterior (SECEX) do Ministério da Economia, por meio de Ato Concessório que passa a ser gerenciado em módulo próprio do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX), denominado Drawback Web.

O regime consiste no principal e mais democrático regime especial aduaneiro utilizado pelos importadores brasileiros – prova disso são os índices oficiais da Secretaria Especial da Receita Federal do mês de Abril[2] deste ano que apontam que as exportações amparadas pelo Drawback representaram 18% do total das exportações praticadas no período, representando cerca de US$ 3,2 bilhões de dólares.

O gerenciamento dos insumos importados e das mercadorias industrializadas destinadas à exportação é causa de muitas exigências pela Fiscalização que, não raras vezes, apontando o inadimplemento do regime por entender pela ausência de vinculação física entre os insumos importados e os bens exportados, exigindo, inclusive, que haja escrituração contábil segregada que demonstre que os insumos industrializados resultaram nos produtos exportados.

A polêmica paira justamente sobre a vinculação física. De um lado, para o Fisco, a falta da vinculação física entre os produtos importados e os exportados é fundamento suficiente para determinar o inadimplemento do regime e lançar os tributos suspensos; de outro, os contribuintes argumentam a ocorrência de perdas no processo produtivo, nacionalização do excesso de estoque e impossibilidade de vinculação individualizada do insumo importado como justificativa para afastar o argumento.

No entanto, o entendimento do Fisco não se sustenta diante do texto do artigo 17 da Lei 11.774/2008, que define que os insumos importados sob o amparo do regime podem ser substituídos por outros, importados ou adquiridos no mercado interno, desde que sejam da mesma espécie, quantidade e qualidade[3]. Ora: tal faculdade atribuída pela legislação constitui desconsideração da exigência da vinculação física.

Nessa linha, o CARF proferiu o Acórdão nº 3402-007.515 destacando a inaplicabilidade da vinculação física, desde que houvesse a observância do critério de equivalência previsto na Portarias Conjunta RFB/SECEX 467/2010[4].

No caso concreto, a autuada, indústria do ramo têxtil, importou o produto “DMT — Dimetil Tereftalato” pelo seu estabelecimento localizado em Simões Filho/BA, que passava por prévio processo químico de industrialização e era remetido para outro estabelecimento localizado em Americana/SP. Esse produto intermediário era novamente submetido a processo de industrialização e, posteriormente, exportado.

A Fiscalização lavrou o Auto de Infração alegando, em síntese, que: (i) a exportação era anterior à produção das mercadorias com a matéria prima importada sob o regime de drawback; (ii) a exportação de mercadorias produzidas se deu com matéria-prima diversa da pertencente ao Ato Concessório. Após a impugnação do contribuinte, a DRJ manteve a autuação fiscal, sob o fundamento de que a autuada não teria demonstrado que a mercadorias importadas haviam sido empregadas no processo produtivo das mercadorias exportadas.

Foi dado total provimento ao Recurso Voluntário do contribuinte. A Conselheira Relatora Thais De Laurentiis Galkowicz fundamentou seu voto na alteração legislativa promovida pelo artigo 17 da Lei 11.774/2008, visto que o dispositivo “(...) aponta que aqueles bens que se apresentarem com as mesmas características espécie, qualidade e quantidade, podem ser substituídos por outros. Por conseguinte, com a inovação legislativa, a observância do princípio da vinculação física para a fruição da modalidade do drawback-suspensão passou a considerar, para tanto, a particularidade do produto importado, de modo a conferir maior segurança jurídica e justiça aos sujeitos passivos”.

Em outro trecho do arresto, fazendo menção ao Voto da Conselheira Tatiana Midori, no Acórdão 9303006.989, afirma que “(...) a observância ao princípio foi afastada quando o beneficiário do regime suspensivo - permitiu-se importar insumos do exterior, vendê-los no mercado interno e, posteriormente, adquirir outros, também no mercado interno, nacionais ou importadas, da mesma espécie, qualidade e quantidade para empregá-los no processo de industrialização daqueles produtos a exportar”.

Sendo assim, verifica-se certa evolução na jurisprudência do Conselho em afastar a vinculação física para as mercadorias fungíveis (substituíveis) amparadas pelo regime do Drawback, na medida em que a lei ordinária permite tal substituição. O Fisco tem desconsiderado o preceito normativo exposto e determinado o inadimplemento indiscriminado do regime com base na vinculação física, no entanto, cabe destacar que os contribuintes detêm argumento relevante para derrubada das autuações fiscais dessa espécie.


[1] Art. 383.  O regime de drawback é considerado incentivo à exportação, e pode ser aplicado nas seguintes modalidades:

I - suspensão - permite a suspensão do pagamento do Imposto de Importação, do Imposto sobre Produtos Industrializados, da Contribuição para o PIS/PASEP, da COFINS, da Contribuição para o PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação, na importação, de forma combinada ou não com a aquisição no mercado interno, de mercadoria para emprego ou consumo na industrialização de produto a ser exportado;

II - isenção - permite a isenção do Imposto de Importação e a redução a zero do Imposto sobre Produtos Industrializados, da Contribuição para o PIS/PASEP, da COFINS, da Contribuição para o PIS/PASEP-Importação e da COFINS-Importação, na importação, de forma combinada ou não com a aquisição no mercado interno, de mercadoria equivalente à empregada ou consumida na industrialização de produto exportado; e

III - restituição - permite a restituição, total ou parcial, dos tributos pagos na importação de mercadoria exportada após beneficiamento, ou utilizada na fabricação, complementação ou acondicionamento de outra exportada.

[2] Dados compilados sobre Drawback Suspensão e Isenção Abril De 2020 – Disponível em http://www.siscomex.gov.br/wp-content/uploads/2020/09/202004.pdf

[3] Art. 17.  Para efeitos de adimplemento do compromisso de exportação nos regimes aduaneiros suspensivos, destinados à industrialização para exportação, os produtos importados ou adquiridos no mercado interno com suspensão do pagamento dos tributos incidentes podem ser substituídos por outros produtos, nacionais ou importados, da mesma espécie, qualidade e quantidade, importados ou adquiridos no mercado interno sem suspensão do pagamento dos tributos incidentes, nos termos, limites e condições estabelecidos pelo Poder Executivo.

[4] Art. 5º-A (...)

§ 1º Poderão ser reconhecidas como equivalentes, em espécie e qualidade, as mercadorias que, cumulativamente:  (Incluído(a) pelo(a) Portaria Conjunta RFB Secex nº 1618, de 02 de setembro de 2014)

I - sejam classificáveis no mesmo código da NCM; (Incluído(a) pelo(a) Portaria Conjunta RFB Secex nº 1618, de 02 de setembro de 2014)

II - realizem as mesmas funções; (Incluído(a) pelo(a) Portaria Conjunta RFB Secex nº 1618, de 02 de setembro de 2014)

III - sejam obtidas a partir dos mesmos materiais; (Incluído(a) pelo(a) Portaria Conjunta RFB Secex nº 1618, de 02 de setembro de 2014)

IV - sejam comercializadas a preços equivalentes; e (Incluído(a) pelo(a) Portaria Conjunta RFB Secex nº 1618, de 02 de setembro de 2014)

V - possuam as mesmas especificações (dimensões, características e propriedades físicas, entre outras especificações), que as tornem aptas ao emprego ou consumo na industrialização de produto final exportado informado.  (Incluído(a) pelo(a) Portaria Conjunta RFB Secex nº 1618, de 02 de setembro de 2014)

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