DRJ decide pela anulação de auto de infração de multa aduaneira por vício formal

Receita Federal afasta multa aduaneira imposta antes da conclusão do processo em que se discutia a penalidade administrativa de advertência.

Bárbara Bach
Michel Alkimin
Publicado em: 15/06/2021

Recentemente a 7ª Turma da Delegacia de Julgamento da Receita Federal 03 (DRJ03/CE) julgou procedente impugnação de auto de infração para declarar a nulidade do lançamento por vício formal, cancelando a multa exigida com fundamento na alínea “e” do inciso VII do art. 107 do Decreto-lei nº 37/1966[1], por suposto descumprimento da obrigação de habilitação no Linha Azul, requisito que era exigido pela IN RFB n° 1.291/2012 (art. 5º, inciso VI[2] e art. 12, §4°[3]) por ser o autuado beneficiário do RECOF.

A motivação da anulação está no fato da ciência relativa do Auto de Infração da multa ter se dado logo no dia seguinte à ciência da penalidade administrativa (no caso, advertência[4]), deixando de ser atendida formalidade legal para a lavratura do lançamento, qual seja, a exigência da multa apenas depois de concluído o processo referente à sanção administrativa decorrente da conduta que deu ensejo à autuação, conforme preceitua o art. 728, § 4º, do Decreto nº 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro)[5].

Quando a conclusão é pela nulidade por vício formal é possibilitado à Administração Pública proceder com novo lançamento, corrigindo os vícios inicialmente verificados, ao passo que os anulados por vício material são definitivamente extintos, não restando qualquer possibilidade de nova discussão sobre aquele lançamento anulado, ante a impossibilidade de reparar o vício, por estar relacionado à regra matriz de incidência.

Quanto à fundamentação para anulação por vício formal o acórdão afirmou que “(...) a legislação é clara ao impor uma condição para aplicação da multa pecuniária no caso sob exame: qual seja, a de que a exigência da multa somente poderá ser efetuada após a conclusão do processo relativo à aplicação da sanção administrativa. (...) Desta forma, conclui-se que o lançamento objeto do presente processo é nulo, padecendo de vício de natureza formal, posto que não está relacionado com a regra matriz de incidência da multa descrita pela autoridade fiscal”.

Nota-se, no caso, que foi antecipada a regra matriz de incidência da multa para momento indevido e previamente estabelecido em legislação. Dessa forma, não caracterizados os fatos para que esteja configurada a hipótese legal prevista na regra matriz (qual seja, a devida conclusão do processo de sanção administrativa), há um vício na essência do lançamento, de modo que seria passível de caracterizar até mesmo vício material ao invés de vício formal como entendeu a DRJ.

Apesar disso, entendendo pela anulação por vício formal, somente é lícito prosseguir com novo lançamento se: 1) verificado que devidamente observado o procedimento legal, neste caso, regular tramitação e conclusão do processo administrativo referente à sanção administrativa; 2) ausência de decurso do prazo decadencial.

Com relação ao item 2, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) já decidiu que para as multas aduaneiras “(...) o prazo decadencial é estabelecido pelos arts. 139 do Decreto-lei n. 37/66 e 753 do Regulamento Aduaneiro, os quais estabelecem que o prazo para a constituição da sanção é de 05 anos e tem como termo inicial a data da infração” (Acórdão 3302-005.749, 3ª Câmara / 2ª Turma Ordinária, Sessão: 28/08/2018).

Apesar de haver a possibilidade da Fiscalização entender que a anulação por vício formal em relação às multas aduaneiras ensejaria, por analogia, a aplicação do art. 173, inciso II do Código Tributário Nacional (CTN) que dispõe que “O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: (...) da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado”, o entendimento do CARF e da CSRF (Câmara Superior de Recursos Fiscais) tem estabelecido a aplicação do artigo 139, do Decreto-Lei 37/66[6], fixando como termo inicial do prazo quinquenal decadencial, a data da infração aduaneira.

É importante atentar-se com a devida cautela que não se pode atribuir automaticamente dispositivos que regulamentam as obrigações tributárias às obrigações decorrentes do controle aduaneiro, visto que tuteladas por ramos distintos do Direito que possuem legislações específicas.

Nesse sentido, se destaca certo caso de lançamento de multa aduaneira, em que a CSRF (Acórdão nº 9303-011.040 CSRF / 3ª Turma Sessão de 08/12/2020) afastou o entendimento da PGFN de aplicar os dispositivos do CTN que tratam da decadência (art. 150, §4º e art. 173). No julgado, se aplicou o princípio da especialidade, sob o argumento de que, tratando-se de multa aduaneira, deve prevalecer o artigo 139, do Decreto-Lei 37/66 em detrimento das disposições do CTN.

A Lira Advogados, referência na atuação aduaneira, afirma a importância do olhar atento às disposições específicas decorrentes do controle aduaneiro, a fim de evitar o prosseguimento de autuações indevidas.


[1]    Art. 107. Aplicam-se ainda as seguintes multas: (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 29.12.2003)

(...) VII - de R$ 1.000,00 (mil reais): (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 29.12.2003)

(...) e) por dia, pelo descumprimento de requisito, condição ou norma operacional para habilitar-se ou utilizar regime aduaneiro especial ou aplicado em áreas especiais, ou para habilitar-se ou manter recintos nos quais tais regimes sejam aplicados;

[2] Art. 5º Para habilitar-se ao regime, a empresa interessada deverá atender aos seguintes requisitos:

(...) VI - estar habilitada ao Despacho Aduaneiro Expresso (Linha Azul), em conformidade com a regulamentação específica.   (Revogado(a) pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1559, de 14 de abril de 2015)

[3] Art. 12. Compete à unidade da RFB referida no caput do art. 11: (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1904, de 31 de julho de 2019)

(...) § 4º Na verificação do requisito previsto no inciso VI do art. 5º, será aceita a protocolização de pedido de habilitação à Linha Azul, apresentado na forma da legislação aplicável, ficando a eficácia das disposições contidas no § 1º do art. 21, no art. 22 e no § 6º do art. 29 condicionada à publicação do correspondente ato declaratório de habilitação.   (Revogado(a) pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1559, de 14 de abril de 2015)

[4] (Regulamento Aduaneiro – Decreto 6.759/2009)

Art. 735.  Os intervenientes nas operações de comércio exterior ficam sujeitos às seguintes sanções (Lei nº 10.833, de 2003, art. 76, caput):

I - advertência, na hipótese de:

(...) i) descumprimento de requisito, condição ou norma operacional para habilitar-se ou utilizar regime aduaneiro especial ou aplicado em áreas especiais, ou para habilitar-se ou manter recintos nos quais tais regimes sejam aplicados; (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010).

[5] Art. 728.  Aplicam-se ainda as seguintes multas (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 107, incisos I a VI, VII, alínea “a” e “c” a “g”, VIII, IX, X, alíneas “a” e “b”, e XI, com a redação dada pela Lei no 10.833, de 2003, art. 77):

(...) § 4º Nas hipóteses em que a conduta tipificada neste artigo ensejar também a imposição de sanção administrativa referida no art. 735 ou 735-C, a lavratura do auto de infração para exigência da multa será efetuada após a conclusão do processo relativo à aplicação da sanção administrativa, salvo para prevenir a decadência. (Redação dada pelo Decreto nº 8.010, de 2013)

[6] Art.138 - O direito de exigir o tributo extingue-se em 5 (cinco) anos, a contar do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que poderia ter sido lançado.

Parágrafo único. Tratando-se de exigência de diferença de tributo, contar-se-á o prazo a partir do pagamento efetuado.

Art.139 - No mesmo prazo do artigo anterior se extingue o direito de impor penalidade, a contar da data da infração.

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