A Ascensão dos Advogados Aduaneiros no Brasil

Publicado em: 28/10/2012


Alexandre Lira de Oliveira

 

O processo de amadurecimento da abertura econômica do Brasil e do crescimento de sua participação no comércio internacional modifica o ambiente nacional, aperfeiçoando diversas entidades e categorias profissionais. Considerando apenas 2012 é evidente o desenvolvimento da Administração Pública para lidar com as questões relativas às trocas internacionais, sendo que podemos exemplificar isso pelo aumento do contingente de Analistas de Comércio Exterior e mudança física da Secretaria de Comércio Exterior, a criação do CERAD – Centro Nacional de Gestão de Riscos Aduaneiros e o aumento das discussões quanto às dificuldades de gestão da fronteira terrestre brasileira. Pelo lado do Setor Privado também percebem-se melhorias, com o aumento da oferta de faculdades com cursos de Comércio Exterior e com o exame para habilitação de despachantes aduaneiros.

Contudo, o Setor Privado brasileiro se recente da ausência de uma categoria profissional que participa das operações nos países que compõe a comunidade de comércio internacional, que são os profissionais da área jurídica. Considerando que as operações comerciais transfronteiriças são integralmente reguladas por normas jurídicas que definem a sua classificação, valoração, origem, normas técnicas, benefícios, cotas, restrições, incentivos, procedimentos, documentação, transporte, embalagem, acondicionamento e muito mais que necessária a contribuição dos bacharéis devidamente treinados para a interpretação das normas jurídicas (hermenêutica) às rotinas do comércio internacional.

Essa necessidade já é conhecida há décadas nos ricos países que tem seu controle aduaneiro desenvolvido e cultura de comércio internacional amadurecida há muitas décadas. No Brasil é um processo novo e contemporâneo ao fenômeno que chamamos de “A Transformação do “Trade Compliance” Corporativo na América Latina” na apresentação que fizemos no Global Customs Forum 2012, em São Paulo no dia 19 de Setembro deste ano. Na ocasião defendemos que os executivos responsáveis pelas área de comércio exterior nas empresas em atividade no Brasil tiveram seu perfil alterado nos últimos anos: deixaram de ser os gerentes das “relações governamentais” – que incluíam as rotinas aduaneiras – e passaram a ser verdadeiros gestores corporativos, envolvidos com (i) as políticas de governança corporativa das empresas que representam, com (ii) a gestão de pessoas – muitas vezes em diferentes países, (iii) com os resultados da operação, sobretudo, e (iv) com o cumprimento das normas de comércio internacional[1].

Esses novos gestores corporativos do comércio internacional valorizam sobremaneira o perfeito e voluntário cumprimento das normas aduaneiras (“customs compliance”) para correr riscos que podem ser evitados e por isso decidem pela inclusão dos advogados na definição dos procedimentos relacionados às normas de comércio exterior. A atuação preventiva é imprescindível para garantir a fluidez necessária às operações, evitando questionamentos e retenções de mercadorias, que causam prejuízos vultosos e podem ensejar o descumprimento de um prazo de entrega com cliente e até mesmo a perda de um contrato comercial. O correto assessoramento jurídico contribui com a cristalização de procedimentos para definição da logística utilizada, regimes aduaneiros, custos tributários e até mesmo os processos industriais e comerciais subsequentes à importação ou anteriores à exportação.

Em caso de litígios versando sobre normas aduaneiras, mais necessária ainda a presença de advogado que seja especialista nessas questões. No Brasil as inspeções documentais e físicas nos despachos aduaneiros de importação tem crescido sobremaneira desde o início da operação Maré Vermelha e com isso aumentam-se também os questionamentos e autuações. Desde a primeira exigência feita pelo Auditor Fiscal recomenda-se que haja o acompanhamento do processo pelo advogado aduaneiro de maneira e controlar as informações que são prestadas e verificar a abrangência da questão envolvida pela exigência às operações. Obviamente que as empresas íntegras nada tem a esconder da Administração Aduaneira, mas sempre há um melhor momento e uma melhor forma de comunicar-se com a Alfândega.

Tanto no contencioso administrativo como judicial é imperativo que a empresa seja representada por advogado que realmente seja especialista na área de comércio internacional. Recentemente passou a haver no Brasil uma atenção maior dos escritórios de advocacia às questões aduaneiras, mas geralmente estas são tratados como subprodutos dos Departamentos Tributários[2], não oferecendo conhecimento especializado. Isso é muito perigoso. Por se tratar de uma área demasiadamente específica e dinâmica, com a existência de normas jurídicas que partem de tratados internacionais e chegam até aos parâmetros e notícias do Siscomex e atualizadas diariamente, é necessário que os advogados conheçam profundamente as operações e normas aplicáveis, sendo capazes de demonstrar aos juízes a realidade dos fatos e do Direito, otimizando as possibilidades de êxito nas discussões. Considerando que não temos órgãos julgadores especializados em questões aduaneiras no Brasil e que os atos da Fiscalização têm presunção relativa de legitimidade, os riscos aumentam ainda mais.

Sabemos que em nosso país é comum na área de comércio exterior, tanto no Setor Público quanto Privado, criticar o trabalho dos advogados, acusados de não conhecerem as operações, não serem diretos mas distantes da realidade do negócio e lentos. Realmente a área de comércio exterior é muito dinâmica, tendo conceitos próprios e prazos sempre os mais curtos quanto possível, cabendo aos advogados que desejam aqui atuar se especializar profundamente e realmente ser muito rápidos em seus raciocínios, nas respostas e preparação de defesas, apresentações e pareceres, que sempre devem estar perfeitos – já que com qualquer erro perde-se muito. Para o Brasil é imprescindível o surgimento dessa nova especialização dentre os nossos advogados. Somente com a ascensão dos Advogados Aduaneiros poderá ser concluído o ciclo de transformação da gestão das normas de comércio internacional no Brasil.



[1]Leia o nosso artigo “A Transformação da Gestão do Comércio Exterior nas Empresas no Brasil” em https://www.liraatlaw.com/conteudo/a-transformacao-da-gestao-do-comercio-exterior-nas-empresas-no-brasil

[2]Nesse ponto cometem o mesmo equívoco que a Receita Federal do Brasil, que costuma tratar o Direito Aduaneiro como uma divisão do Direito Tributário, sem desenvolver as capacidades específicas necessárias.

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