IN SRF 466/04: armadilha aos exportadores

Publicado em: 15/10/2009
Alexandre Lira de Oliveira e Francisco Antonio D’Angelo

O art. 40 da Lei 10.865, alterado pela Lei 10.925, determina a suspensão do PIS/Cofins na aquisição de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem (MP, PI e ME) por industria preponderantemente exportadora. No dia 5.11.2004, a SRF publicou a IN 466, que regulamenta o dispositivo e o restringe de forma indevida. Aqui vamos criticar as restrições impostas pelo ato da SRF, que tornam inoperante benefício legal que visa fomentar o comércio exterior brasileiro.

O § 1º do art. 40 define como preponderantemente exportador aquele cuja receita bruta no ano anterior for originada, em 80% ou mais, de exportações. O estabelecimento vendedor das MP, PI e ME aproveitará créditos referentes aos insumos utilizados na sua produção, conforme o § 3º, e os exportadores deverão atender aos termos e às condições estabelecidos pela SRF, nos termos do § 4º. Até onde pode se estender a SRF, ao estabelecer condições para utilização desta suspensão?

Antes de respondermos, entendamos os impactos financeiros causados pela suspensão, considerando os créditos e a absorção de custo sobre as aquisições de MP, PI e ME pela pessoa jurídica industrial exportadora.

Utilizemos como exemplo a Fundição-X, que exporta 100% das carcaças produzidas e usa MP adquirida no mercado interno. Na sistemática anterior todas as suas compras eram tributadas pelo PIS/Cofins e lhe garantiam créditos, que - devido às saídas para exportação, imunes de tributação - se acumulavam em sua escrita fiscal, tendo que ser utilizados para compensação de outros tributos federais ou restituição em espécie, terminado o trimestre e suportado o trâmite administrativo.

Com o novo tratamento, a Fundição-X deverá adquirir a MP com a suspensão das contribuições e não poderá mais creditá-las, eliminando o acúmulo de créditos. Será pleiteado de seus fornecedores o desconto de 9,25% do preço, referente ao PIS/Cofins não mais incidente. Estes fornecedores poderão utilizar os mesmos créditos que usavam antes, conforme acima exposto.

O custo absorvido pela Fundição-X não se altera, pois no primeiro momento 9,25% do valor das compras de MP foi creditado e no segundo o crédito é zero, mas a MP entrou desonerada do PIS/Cofins. A alteração legislativa corrige a operação: a suspensão da incidência das contribuições evita o acúmulo de créditos nos exportadores, que prejudicava seu fluxo de caixa. Não se altera a arrecadação, mas o momento do recolhimento, pois todo o PIS/Cofins que deixa de ser recolhido pelo fornecedor também deixa de ser creditado pelo exportador.

Imaginemos agora a Fundição-Y, que exporta 85% das carcaças que produz. Também nesse caso há suspensão, mas surge questionamento: às compras de MP para produção de carcaças vendidas no mercado interno é estendida a suspensão?

Antes da resposta analisemos a Lei 10.637, que no art. 29, § 1º, II, traz caso perfeitamente análogo: suspensão do IPI (também tributação não-cumulativa) para aquisição de MP, PI e ME por pessoas jurídicas preponderantemente exportadoras. Neste caso a Lei também ressalva o atendimento às condições estabelecidas pela SRF para utilização da suspensão, pelo que nos deslocamos para a IN 296. A IN não veda a utilização da suspensão para compras de materiais que serão utilizados na produção a ser vendida no mercado interno, se o exportador atingir o percentual estipulado de preponderância. Vendida a produção no mercado interno haverá o recolhimento do IPI.

Considerando que a suspensão não representa isenção e sim diferimento no momento do recolhimento, não há prejuízo na arrecadação tributária, mas apenas alteração do fluxo de caixa em favor da exportadora, devido à condição subjetiva estabelecida pela Lei.

Munidos do entendimento anterior da SRF sobre o assunto, ao regulamentar a legislação sobre a suspensão do IPI, perfeitamente análoga ao art. 40 da Lei 10.865, passemos à resposta da pergunta, que representa o auge dessa argumentação: a suspensão do PIS/Cofins é estendida às compras de metais para produção de carcaças vendidas no mercado interno pela Fundição-Y?

Fosse a pergunta referente ao IPI, a resposta seria afirmativa, e o recolhimento ocorreria na saída no mercado interno. Antes de adentrarmos na IN 466 temos a expectativa da coerência da SRF, reservando um tratamento similar para regulamentação de Leis perfeitamente similares.

Determina o art. 8º da IN 466 que "a aplicação do regime, em relação às MP, PI e ME adquiridos com suspensão, se extingue com a adoção, pela pessoa jurídica preponderantemente exportadora, de uma das seguintes providências: I - exportação (...); II - venda à pessoa jurídica comercial exportadora (...); III - destruição; e IV - venda no território nacional da MP, PI e ME ou de produto ao qual foram incorporados."

E, infelizmente, o art. 8º vem seguido de seu parágrafo único: "nas hipóteses de extinção referidas nos incisos III e IV deve ser efetuado o pagamento, pela pessoa jurídica de que trata o caput, das correspondentes contribuições com a incidência suspensa, acrescidas de juros de mora e multa, de mora ou de ofício, calculados a partir da data da aquisição de MP, PI e ME no regime."

Pasmem: no caso da Fundição-Y utilizar MP, PI e ME adquiridas com a suspensão do PIS/Cofins em produtos vendidos no mercado interno, decidiu a SRF em sua IN que será ela penalizada com o recolhimento das contribuições suspensas, corrigidas pela SELIC com multa de até 75%! Além de inconstitucional, por estipular penalidade sem Lei que o preveja, essa medida torna inoperante a suspensão que, nos termos do art. 1º da própria, deve ser aplicada.

Torna-se custoso mais um controle estanque de estoques de MP, PI e ME, desta vez para utilização de "regime" para aquisição destes insumos no mercado interno com a suspensão do PIS/Cofins. Além disso, o risco de desvio de finalidade é muito grande: a Fundição-Y trabalha com estoque mínimo e, em havendo MP no estoque para exportação e falta de MP no estoque para o mercado interno, acabaria tendo que utilizar a outra reserva, incorrendo em infração à legislação tributária, que poderia ser mais custosa que o ganho de caixa auferido com a suspensão, tornando-a inoperante.

Quisesse a Lei que houvesse penalidade pelo uso da suspensão para a produção destinada ao mercado interno, não teria criado o critério subjetivo da preponderância, mas sim estabeleceria controles que possibilitassem estritamente que apenas as MP,PI e ME destinadas à exportação fossem faturadas ao exportador com suspensão do PIS/Cofins. A Lei determina que todas as aquisições de MP, PI e ME por industriais preponderantemente exportadoras serão suspensas do PIS/Cofins e a IN estabelece multa no caso de venda para o mercado interno, o que representa uma armadilha da SRF.

Assim, ao dispor a suspensão da incidência das contribuições como um dever e fixar recolhimento e penalidades relativos à parcela destinada ao mercado interno, o único bem que a SRF faz é assegurar a si ingressos adicionais. Ao exportador, mais custo.
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