Eliminação da dupla cobrança da tarifa externa comum e distribuição da renda aduaneira no mercosul

Publicado em: 07/10/2009

Alexandre Lira de Oliveira

A Decisão CMC no 37/05, do Conselho do Mercado Comum do Mercosul, de 8 de dezembro de 2005, publicada pelo Decreto 5.738, de 30 de março de 2006, representa o cumprimento da primeira etapa traçada para implementação da livre circulação de mercadorias no Mercosul, regulamentando, transitoriamente, a Decisão CMC 54/04, que trata do tema.

Consiste esta primeira etapa na outorga de tratamento de bens originários do Mercosul aos bens importados de terceiros países aos quais se aplique uma Tarifa Externa Comum (TEC) de 0% em todos os Estados Parte do Mercosul e aos bens aos quais seja aplicada 100% de preferência tarifária no âmbito de acordos assinados pelo Mercosul, quando os mesmos forem originários e provenientes de países aos quais se outorga tal preferência.

A etapa seguinte do processo, prevista na Decisão CMC no 54/04, de 16 de dezembro de 2004, consistirá na aplicação de tratamento de bens originários às importações de extra-zona que cumpram com a Política Tarifária Comum (PTC) do Mercosul, no que se refere tanto à sua circulação dentro do Mercosul, como à sua incorporação em processos produtivos.

O cumprimento da PTC consiste no pagamento da TEC, na aplicação da mesma preferência tarifária sobre a TEC, por todos os Estados Partes do Mercosul, em função dos acordos comerciais assinados com terceiros países, ou na aplicação de medidas de defesa comercial e permitirá à mercadoria importada de terceiro país o tratamento de bem originário do Mercosul, podendo assim circular livremente pela União Aduaneira, sem a reincidência tarifária.

A atribuição do caráter de originário aos bens importados de terceiros países que tenham cumprido com a PTC atende às exigências de outros blocos econômicos em processo de negociação com o Mercosul, como é o caso da União Européia, onde os produtos internalizados encontram esse tipo de tratamento na circulação entre os Estados Parte.

Conforme a exposição de motivos da Decisão CMC no 54/04, esta medida "constitui um avanço imprescindível no processo de integração, estimulando a incorporação de valor agregado aos produtos originários da União Aduaneira e a promoção de novas atividades produtivas". "No contexto do processo de aperfeiçoamento da União Aduaneira, os Estados Partes se encontram dedicados, entre outras coisas, à harmonização do tratamento tarifário aplicado aos bens importados de extra-zona, com o objetivo de estabelecer um processo que permita, posteriormente, a livre circulação dos mesmos", com os devidos procedimentos de controle, distribuição de renda aduaneira e eliminação da multiplicidade da cobrança da TEC.

Para implementação da livre circulação deverão ser cumpridas uma série de medidas, cuja execução vem sendo considerada desde a XXVIII Reunião Ordinária do CMC, havida em Assunção em 18.6.2005, que consistem em aprovar e colocar em vigência até o final de 2008:

(i) O Código Aduaneiro do Mercosul;

(ii) Um sistema informático que deverá alimentar uma base de dados com informações necessárias para a futura distribuição de renda aduaneira do Mercosul; e

(iii) Um mecanismo contemplando as circunstâncias especiais e específicas dos Estados Partes com relação aos eventuais impactos resultantes da aplicação da livre circulação de mercadorias.

Por enquanto, como inicialmente ressaltado, apenas a primeira etapa da Decisão CMC no 54/04 está implementada, encontrando regulamentação no âmbito do Mercosul na Decisão CMC no 37/05, trazida ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto 5.738/06 e disciplinada pelas Instruções Normativas (IN) da Secretaria da Receita Federal (SRF) de 645 e 646, ambas de 18 de abril de 2006.

A Decisão CMC no 37/05 divulga uma lista positiva de bens importados de terceiros países aos quais será atribuído o caráter de originários, respeitando as condições desta primeira etapa, quais são: ser gravados pela TEC em 0% ou receberem 100% de preferência tarifária no Mercosul por originários de países que têm acordo com o Bloco.

O Anexo I desta Decisão relaciona 680 posições tarifárias às quais a TEC prevê a alíquota de 0% e o Anexo II relaciona itens que têm uma preferência tarifária de 100% por força de acordos internacionais celebrados pelo Mercosul com outros países, estando os referidos itens identificados por países de origem. Neste Anexo II estão incluídos 9237 itens provenientes da Bolívia, 9070 do Chile, 81 da Colômbia, 67 do Equador e 56 da Venezuela. Também é composta a Decisão pelo Anexo III, que traz produtos que não receberão o tratamento de originários por ser-lhes aplicada medida de defesa comercial ou salvaguarda, estando ali presente apenas uma posição tarifária quando oriunda do Chile.

É prevista a atualização destes Anexos pela Comissão de Comércio do Mercosul quando houver mudanças na TEC que atribuam 0% a novos itens, ou modificações nas Listas de Exceções à TEC de algum Estado Parte, com a celebração de novos acordos que estabeleçam preferências quadripatites de 100% ou sejam estas alcançadas por cronograma de desgravação tarifária ou quando houver renegociações nas Regras de Origem no âmbito de um acordo celebrado pelo MERCOSUL com terceiros países. A atualização destes Anexos ocorrerá em 1o de janeiro ou em 1o de julho de cada ano, conforme seja o caso.

Para operacionalização das medidas acima relatadas, possibilitando a execução do que chamamos de primeira etapa na implantação da livre circulação de bens no Mercosul e preparando os controles necessários para a efetivação desta e também da distribuição de renda aduaneira, a Decisão CMC no 37/05 veicula uma série de normas em seu Capítulo II, que tratam da "Certificação de Cumprimento da Política Tarifária Comum", do "Ingresso de bens de extra-zona", da "Certificação Aduaneira de produtos com certificado de origem MERCOSUL", da "Saída de bens originários ou que cumpriram a PTC de um Estado Parte para outro Estado Parte", do "Ingresso aos Estados Partes de bens de extra-zona e com certificação de origem Mercosul" e da "Discrepância de classificação tarifária".

Estes controles serão geridos pelo sistema informático chamado de "Sistema Indira" e são pormenorizados nos textos das IN SRF 645, que disciplina o tratamento de mercadorias importadas e exportadas que cumpriram a PTC, e 646, que disciplina o tratamento de mercadorias importadas e exportadas que cumpriram o Regime de Origem Mercosul (ROM).

Também são veiculadas pela Decisão CMC no 37/05 normas referentes ao regime de origem de bens processados no Mercosul utilizando materiais de extra-zona que tenham cumprido a PTC, restando esse assunto regulado por esta Decisão e pela Decisão CMC no 1/04 "Regime de Origem MERCOSUL". Como tópico final, trata a Decisão CMC no 37/05 do intercâmbio de informações entre aduanas, que também será gerido pelo Sistema Indira.

Em que pese o fato de tratar-se da implantação apenas da primeira etapa do processo de liberação do fluxo de comércio no Mercosul, ainda restrita a um universo de produtos desgravados - pela TEC 0% ou 100% de preferência tarifária, o que reduz os efeitos práticos da medida - é louvável a atitude do Mercosul em buscar meios de implementar os controles necessários para a livre circulação de bens, com o fim da hoje possível multiplicidade de cobrança da TEC e para distribuição de renda aduaneira no Mercosul.

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