Operador Econômico Autorizado – O Brasil adota o padrão mundial de controle aduaneiro

Publicado em: 17/02/2015

Alexandre Lira de Oliveira

“Não deixe aquilo que é urgente tomar o lugar daquilo que é importante em sua vida.” – C.H. Spurgeon (1834 – 1892)

Os frequentes solavancos que experimentamos no Brasil – país que ao longo de sua história vive em crise política, econômica e social – tendem a nos levar a posturas imediatistas, visando a garantir a subsistência no curto prazo. O planejamento de projetos de grande relevância é prejudicado e, com isso, o desenvolvimento do país subjugado ao segundo plano. Saldar as necessidades urgentes para investir em importantes reformas requer determinação.

A política econômica adotada na última década – amparada em estímulo ao crédito e ao consumo sem endereçar soluções às carências estruturais brasileiras – prejudicou sobremaneira a competitividade da indústria nacional, causando o déficit comercial que advém do declínio das exportações de produtos manufaturados e o aumento das suas importações. O colapso na balança comercial é um tema preocupante, que inclina nossa administração pública ao aumento do protecionismo e outras medidas de curto prazo, que não lograrão melhorar a situação da indústria brasileira.

Felizmente, um projeto de enorme relevância para o desenvolvimento econômico nacional está sendo conduzido pela nossa Administração Aduaneira, que é a implantação do padrão internacional “Operador Econômico Autorizado” (OEA). O programa foi anunciado no começo de 2014, com as seguintes etapas:

  • Dezembro de 2014 – OEA-Segurança – voltado a assegurar o fluxo de exportação
  • Dezembro de 2015 – OEA-Conformidade – aplicável aos fluxos de importação e exportação
  • Dezembro de 2016 – OEA-Integrado – com maior harmonização de controles e benefícios com outros intervenientes (ANVISA, VIGIAGRO)

Apesar dos prazos apertados para implementação da sistemática, a Receita Federal do Brasil conseguiu cumprir a meta de implantação da primeira etapa, que é o OEA-Segurança, cujas normas foram veiculadas pela Instrução Normativa 1.521, publicada em 4 de Dezembro de 2014.

O OEA é o principal instrumento da Estrutura Normativa da OMA[1] (Organização Mundial das Aduanas) para facilitar e assegurar o comércio internacional e está fundado no pilar de parceria entre Aduana e Empresa. Visa a credenciar empresas que demonstrem rígidos controles de segurança de sua cadeia logística e elevado grau de conformidade de suas obrigações aduaneiras, que assim se tornam parceiros da Administração Aduaneira, que, em contrapartida, oferece benefícios especiais para essas corporações[2].

Benefícios

A modalidade OEA-Segurança (OEA-S) já está em funcionamento, sendo que as empresas interessadas em obter a acreditação poderão apresentar seus requerimentos a partir de 2 de março de 2015. Todos os elos da corrente logística são abrangidos pelo regime, que prevê a habilitação do importador ou exportador, depositário de mercadoria sob controle aduaneiro, operador portuário ou aeroportuário, transportador, despachante aduaneiro e agente de carga. Pelo OEA-S são conferidos diversos benefícios para as empresas habilitadas, que são relacionados no Anexo II da IN RFB 1.521/14:

  • Utilizar de canal direto de comunicação com a RFB;
  • Fruir de reduzido percentual de cargas selecionadas para canais de conferência na exportação;
  • Usufruir de processamento prioritário dos despachos de exportação selecionados para conferência;
  • Possuir prioridade para certificação na fase 2 do Programa Brasileiro de OEA;
  • Ser dispensado de prestação de garantia no trânsito aduaneiro;
  • Utilizar a logomarca do Programa Brasileiro de OEA;
  • Ter sua participação no Programa Brasileiro de OEA divulgada no sítio da RFB;
  • Ser dispensado de exigências formalizadas na habilitação ou aplicação de regimes aduaneiros especiais ou aplicados em áreas especiais, que já tenham sido cumpridas no procedimento de certificação no Programa Brasileiro de OEA;
  • Participar ativamente na formulação de propostas de alteração de legislação e procedimentos aduaneiros visando o aperfeiçoamento e a melhoria do Programa Brasileiro de OEA, por meio do Fórum Consultivo OEA.

Além desses benefícios, existe um maior, a ser conferido no futuro, que é decorrente da negociação pelo Brasil de Acordos de Reconhecimento Mútuo (ARM) com parceiros comerciais, que permitam que as cargas exportadas por empresas brasileiras certificadas OEA tenham processamento prioritário na sua importação em países parceiros. Este mecanismo é o cerne do OEA, pois permite que a cadeia de fornecimento tenha a sua segurança controlada desde o produtor na origem até o consumidor no destino, compreendendo as operações de dezenas de empresas em diversos países.

A celebração de Acordos de Reconhecimento Mútuo será de vital importância para o aumento da competitividade do produto brasileiro, já que diversos parceiros comerciais, como Estados Unidos, União Europeia, China, Japão, Coreia do Sul, Singapura, Colômbia, Argentina e México possuem programas de OEA[3]. O sucesso dos ARM dependerá da severidade com que o requisito “segurança da cadeia de fornecimento” será tratado no Brasil, pois esse será o principal elemento analisado pelos parceiros comerciais ao cogitar o ARM: o Brasil é um país de alto risco aduaneiro – sendo um dos principais exportadores de substancias ilícitas ao hemisfério norte – e os outros países não confiarão benefícios a embarques provenientes do Brasil, reduzindo seus controles aduaneiros, se não for comprovada a resiliência do OEA brasileiro.

Para as próximas etapas do OEA – OEA-Conformidade em 2016 e OEA-Integrado em 2017 – são previstos benefícios adicionais, que consistirão na maximização dos benefícios hoje conferidos pelo Linha Azul, com a inclusão dos outros intervenientes governamentais em um fluxo expresso unificado, o que permitirá velocidade no desembaraço aduaneiro de quaisquer mercadorias transacionadas por empresas confiáveis no Brasil.

Requisitos e Critérios de Admissibilidade

A IN RFB 1.521/14 relaciona os seguintes requisitos de admissibilidade:

  • Formalização da solicitação de certificação mediante dossiê digital de atendimento;
  • Adesão ao Domicílio Tributário Eletrônico (DTE);
  • Entrega de Escrituração Contábil Digital;
  • Regularidade fiscal, mediante apresentação de certidão negativa de débitos ou similar;
  • Inscrição no CNPJ e recolhimento de tributos federais há mais de 24 meses;
  • Atuação como interveniente passível de certificação por no mínimo de 24 meses;
  • Inexistência de indeferimento a pedido de certificação ao Programa Brasileiro de OEA nos últimos 6 meses;
  • Experiência mínima de 3 anos e aprovação em exame de qualificação técnica para o despachante aduaneiro; e
  • Adesão à emissão do Conhecimento de Transporte Eletrônico (CT-e) para o transportador.

São estabelecidos os seguintes critérios de elegibilidade:

  • Histórico de cumprimento da legislação aduaneira;
  • Sistema informatizado de gestão comercial, contábil, financeira e operacional, entre outros necessários à atuação do requerente, com registros que permitam procedimentos de auditoria em formato estabelecido pela RFB;
  • Solvência financeira adequada para manter e aperfeiçoar as medidas que garantam a segurança de sua atividade na cadeia logística; e
  • Política de realização periódica de auditorias de controles internos, não apenas contábeis, mas também de procedimentos operacionais, de sistemas de controle e de outros aspectos relacionados às atividades de comércio exterior, com vistas a identificar e corrigir eventuais irregularidades ou deficiências.

De maneira a verificar o cumprimento dos requisitos e critérios de elegibilidade, a Instrução Normativa veicula condições específicas por modalidade e questionário de autoavaliação em seus anexos, sendo fixado um prazo de 90 dias, prorrogável por igual período, para análise e certificação do postulante a OEA. A existência de prazo para a análise é enorme vantagem em face ao Linha Azul, já que, infelizmente, neste regime há histórico de empresas que aguardam a análise de seus pleitos há mais de 4 anos.

O artigo 26 da IN RFB 1.521/14 autoriza a Coana a alterar os anexos da Instrução Normativa, sendo que há expectativa de que haja a publicação de um Ato Declaratório Executivo detalhando a forma de demonstração pelos postulantes a OEA do cumprimento dos requisitos de segurança do regime. Somente a padronização dos formatos dos pleitos apresentados pelo setor privado e dos requisitos de segurança praticados pelas empresas permitirá a celeridade da análise dos pleitos de certificação e a garantia de controles de segurança robustos pelo setor privado.

Certificação do OEA e procedimentos pós-certificação

Apresentado eletronicamente o pleito para certificação e procedida análise favorável de seu conteúdo, a certificação será outorgada por despacho do Chefe da Gerência de Fiscalização e Controle de Intervenientes (Gefin) da Coana. Terá caráter precário e prazo de validade indeterminado, devendo ser objeto de procedimento de revisão em até 5 anos. Durante esse período, o OEA estará submetido a acompanhamento quanto à manutenção dos requisitos e critérios necessários à obtenção da certificação.

Conclusões

Como escrevemos no passado, para que o Brasil prospere economicamente deve ter “clareza de propósito quanto às suas aspirações no mercado global”[4], deixando de enxerga-lo como ameaça, mas como um universo de oportunidades para um país cheio de riquezas como o nosso[5]. Para isso, temos que seguir a recomendação feita por SPURGEON ainda no Século XIX, e lutar pelas nossas urgências sem perder de vista o que realmente importa.

O Brasil tem que se adequar aos padrões internacionais de administração aduaneira, sob pena de ser definitivamente insulado em seus escândalos de corrupção, falta de tecnologia, segurança e competitividade. A implantação do OEA é um importante passo dado pela RFB; compete agora ao setor privado nacional demonstrar confiança, aderindo maciçamente ao novo programa.

Obviamente, já existem comentários pessimistas no mercado, de que o OEA-S somente privilegia o fluxo de exportação – que já é ordinariamente veloz – e seria, dentro dessa linha de pensamento derrotista, ineficaz. Como foi demonstrado no presente artigo, a RFB vem cumprindo os prazos anunciados no início de 2014 e lançou a primeira fase do OEA conforme cronograma. Devemos então confiar que as próximas etapas serão igualmente cumpridas como anunciado.

Utilizar dos benefícios que serão conferidos pelo OEA-Conformidade, pelo OEA-Integrado e as vantagens de Acordos de Reconhecimento Mútuo com Estados Unidos, China e União Europeia no futuro próximo, será essencial instrumento de competitividade, não só perante concorrentes locais, como também globais – e, em casos de grandes multinacionais, até mesmo competidores dentro do próprio grupo econômico.

O OEA-S é um projeto de rápida execução e custos controlados, sendo que a RFB se compromete a proceder com análise e certificação expressa. Mesmo para uma empresa que não tenha enormes volumes de exportação ou problemas operacionais com estas operações, representa uma grande oportunidade de receber prioridade para certificação no OEA-Conformidade em 2016 e ser desde já reconhecida como uma parceira da Administração Aduaneira do Brasil, melhorando seu relacionamento diário com a Aduana.

O “Programa Brasileiro de OEA” é a grande oportunidade do Brasil pensar em longo prazo no que é importante, cabendo também ao setor privado nacional deixar de focar exclusivamente no que é urgente e investir no futuro.



[1]Em inglês “SAFE Framework of Standards to Secure and Facilitate Global Trade”.

[2]Recomendamos a leitura de nosso artigo “A implantação do Operador Econômico Autorizado no Brasil”, disponível em http://www.icibr.org/conteudo/274/a-implantacao-do-operador-economico-autorizado-no-brasil

[3]Confira o Compendio de Programas de OEA da OMA, edição 2012: POLNER, Maryia. Compendium of Authorized Economic Operator Programmes.  Worlds Customs Organization  Research Paper n. 25. 

[4]OLIVEIRA, Alexandre Lira de. Aumento da Competitividade pelo Conhecimento Aduaneiro. Disponível em: https://www.liraatlaw.com/conteudo/aumento-da-competitividade-pelo-conhecimento-aduaneiro

[5]OLIVEIRA, Alexandre Lira de. ICI-BR – O Instituto de Comércio Internacional do Brasil. Disponível em: https://www.liraatlaw.com/conteudo/icibr--o-instituto-de-comercio-internacional-do-brasil

 
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